Apesar de ser tirada do Wikipédia (sabemos nem 100% confiável, e cita sua fonte: Council of Supply Chain Management Professionals, Carvalho, 2002, p. 31), a definição de logística lá é esta: "Logística é a parte do Gerenciamento da Cadeia de Abastecimento que planeja, implementa e controla o fluxo e armazenamento eficiente e econômico de matérias-primas, materiais semi-acabados e produtos acabados, bem como as informações a eles relativas, desde o ponto de origem até o ponto de consumo, com o propósito de atender às exigências dos clientes". Mas vamos ficar com o principal pra nós agora, a distribuição decente. Confiável ou não, todos os envolvidos citados abaixo deveriam ao menos dar uma lida nisto.
Quantas vezes você já não leu em alguma divulgação oficial de uma gravadora, que o CD tal (ou qualquer outro formato) será lançado numa determinada data específica? E específica mesmo, com dia e o mês cravados, geralmente com a frase brega “nas melhores lojas”? Inúmeras, muitas vezes! O tempo todo. Na mesma proporção, salvas poucas exceções, o CD nunca está à disposição. Não só na loja (ou site) que você procura, mas simplesmente ainda não existe, não foi lançado. Frustração, desânimo, vontade de xingar quem “prometeu” são reações comuns.
Normalmente a maioria dos clientes, a princípio, culpa a loja (site...). Quando a loja tem oportunidade, explica, este texto que você está lendo pode também ser tomado como uma destas oportunidades, e a explicação é óbvia: o CD ainda não está disponível na fonte: gravadora ou distribuidora. Claro que estou tomando como princípio que a loja ou site onde você foi procurar não só se interessou pelo CD, como o encomendou numa fonte confiável no prazo adequado. Esta parte da culpa seria, então, da loja. Achamos um culpado, ao menos em potencial, mas há outros...
Pra não ficar só na aquisição física do produto, vamos viajar com exemplo não musical, o cinema, onde, apesar de todas as dificuldades conhecidas na produção de um filme (na verdade na produção de qualquer item de cultural comercializável), pra não acontecer do filme não ser lançado na data e local divulgados, a etapa de P & A = Print and Advertising (cópias do filme e divulgação) tem de ser eficiente, o filme TEM de estar à disposição na data e local exatos da divulgação. E quase sempre está. Voltando no nosso mundo, outro exemplo, o de lançamentos de CDs fora do Brasil, principalmente em países do 1º mundo, onde as datas de lançamento têm de ser exatas como divulgado, neste caso nem sempre, mas mesmo assim muito mais eficientes que aqui no Brasil. Assim como vários filmes simplesmente não são distribuídos, vários CDs também não o são. No caso dos filmes jamais lançados, ou aguardamos uma mostra, um festival ou ainda uma exibição extraordinária, que pode também nunca ocorrer, ou procuramos o DVD e, apelando, baixamos. No caso do CD o usual tem sido apenas a última hipótese.
A mídia está cheia de “fontes seguras” de informação sobre a data “exata” em que o CD estará nas lojas, seja o site da própria banda, ou da gravadora, ou outras, mas nunca procuram esta informação numa fábrica de CDs, claro que não, esta ninguém culpa pelos atrasos, mas muitas vezes, é exatamente aí que pára o CD, a maioria das fábricas simplesmente deixam pra depois um CD com tiragem pequena, que é do que estamos falando, abrindo espaço para um produto a ser fabricado em quantidades maiores, música popular por exemplo, estas músicas de mulheres pouco vestidas, ou músicas descartáveis de programas de TV de domingo ou de comercial de cerveja. Estes CDs, SIM, AINDA VENDEM, passam na frente por cau$a da quantia fabricada, passam na frente de qualquer CD de heavy metal na fila de fabricação. Estou generalizando sim, mas é fato! Agora parte da culpa pode ir para fábrica... Mas prosseguindo, acharemos mais culpados...
Claro que o planejamento é da gravadora, e todas as broncas devem mesmo ser disparadas à ela, sob sua responsabilidade está todo o projeto. Não com o intuito de isentá-la, mas apenas para ilustrar melhor e tentar compreender melhor, vamos lembrar ainda que por cima, as etapas na produção de um CD que ficam sob esta responsabilidade da gravadora: só depois de encontrar (ou ser encontrada) pela banda, ouvir, discutir, aprovar som, imagem e o próprio projeto da banda, a gravadora decide (com a própria banda, geralmente) estúdios e demais profissionais, tendo ainda a gravadora de gerenciar (controlando, aí, os prazos que todos tomamos por princípio, bem planejados) todas as suas fontes provedoras, a arte, compreendendo fotos e arte propriamente dita, com textos e logos obrigatórios, observando lei e normas quanto à numeração de cada música (código internacional ISRC), de cada disco (selo, código de barras), etc... E, por último, mas não menos importante, uma relação surreal: as questões jurídicas que não estão apenas nos textos e logos, mas que são pra lá de estranhas pra se fabricar um CD oficial (pois o pirata, como sabemos, não passa por nada disto), e ainda: gráficas, cartórios, motoboys, bancos, provas, etc... Tudo com um olho no prazo, podendo o CD ser fabricado em Manaus (zona franca, livre de alguns impostos) ou não, advindo daí o transporte, também este causador de atrasos, seja vindo de avião, todos sabemos como estão os aeroportos, ou de caminhão, todos sabemos como estão nossas estradas. Opa, já achamos mais alguns culpados, os aeroportos e as estradas, mas estes são pequenos, tem mais ainda...
Claro que nem todo projeto passa por todos estes passos todos, muitas bandas já têm o trabalho em estado muito adiantado antes de procurar a gravadora, quando não totalmente pronto, e ,quando se trata de licenciamento, ou seja, lançar em território nacional um CD já lançado no exterior, além de não ser todas estas etapas, algumas delas são diferentes, mas não foge muito deste modelo. E então, finalmente, acaba aí a primeira grande etapa (na verdade várias etapas menores juntadas aqui no exemplo numa única pra facilitar) do trabalho da gravadora, a produção, até quando vai prá fábrica. Faltando ainda o trabalho de lançamento, que é a divulgação e a distribuição, e estas duas etapas também estão tão intrinsecamente relacionadas, chegando a ser, na fase de lançamento do CD, uma só. Depois de um tempão do lançamento, uma se sobrepõe à outra, mas sempre intimamente ligadas. A divulgação, às vezes, é iniciada assim que se contratar a banda (ou se licencia um álbum gringo), saindo até na imprensa frases como “o selo tal vai lançar o CD da banda tal na data tal” Data quase sempre fictícias.
Mas quem divulga a tal data tão difícil de cumprir? E quando a divulga? A gravadora (de novo), claro. Se há uma culpa que podemos colocar na gravadora sem maiores problemas de consciência é esta: a da divulgação irresponsável, pois, reservadas aqui as particularidades de cada uma, mesmo que a gravadora delegue esta divulgação pra terceiros, ela é, ainda, a responsável, pois terceirizou “errado”. Uma vez divulgada a data do lançamento, cumpra-se. Não tem como ser diferente. Pronto, conseguimos achar mais um culpado, este de peso, a gravadora, mas não acabaram-se os culpados, tem mais...
Para que os CDs não estejam nas lojas ou sites nas datas divulgadas, já achamos problemas na gravadora, chegando a “culpá-la” (problemas como o mau gerenciamento na administração do tempo ou contratando parceiros incompetentes); na fábrica (não cumprindo prazos por um motivo ou por outro) e na loja (que não encomendou este CD a tempo ou o fez a quem não conseguiu cumprir o prazo) e até aeroportos, estradas e quem sabe até motoristas de caminhão... Bem entendido aqui que problemas jurídicos, falta de insumos e outras irresponsabilidades afins, muitas vezes dos próprios músicos, estão na conta da gravadora, na parte de “mau gerenciamento”, Ed muito bem creditados por sinal.
Pra concluir o raciocínio na identificação dos culpados, pois agora sabemos que não é só um, pelo CD não estar na loja ou no site na data divulgada, há os lançamentos independentes, que não podem ser, genericamente, tratados da mesma forma que o método tradicional aqui neste texto. Estes músicos independentes, por, no mínimo, questão de humanidade de nossa parte, precisam ser compreendidos, temos de “deixar passar”. A ingenuidade (no bom sentido) de muitas bandas causa estragos, pois não é função delas nem a produção, nem a divulgação e nem a distribuição do CD, mas estes músicos TEM de passar por elas, senão o CD não sai. Temos de ser mais solidários com estas bandas independentes, exercitemos nossa compreensão com mais ênfase nestes casos então. Ainda que, mesmo assim muitas delas tiveram de mergulhar na “logística da coisa”, senão não só não teriam o CD como nem a distribuição aconteceria. Infelizmente nem sempre há um assessor à disposição, e os contatos também são complicados, os custos então... Mas é um modelo cada vez mais utilizado com resultados cada vez mais surpreendentes.
Do cinema ainda mais um exemplo, o da independência. Uma nova forma de se “fazer a coisa”, que tem tudo pra se transformar num novo modelo a ser seguido, segundo os especialistas da área, vem de Tropa de Elite 2 (como este filme foi falado!), o diretor José Padilha, que além da direção assumiu muitas outras funções, assumiu também a “etapa” de P & A (Print and Advertising), que é a cópia dos filmes e sua distribuição. No modelo tradicional não é o diretor, claro, quem fica com esta parte (do trabalho e, portanto, da fatia do bolo), mas as corporações, geralmente intere$$adas em outra coisa. Este, talvez, seja o maior mérito deste filme, mais importante até do que seu sucesso “artístico” ou comercial. Aliás, este filme também tem seu roteirista principal, Bráulio Mantovani, e o ator não menos principal, Wagner Moura, como “co-produtores”, tendo ambos entrado como cotistas com seus próprios cachês, isto não é inédito, mas é mais uma prova de uma independência ainda maior, com parte importante da equipe apostando no modelo e, portanto, no resultado final. Na música este comportamento é comum há muito tempo, com a banda produzindo (ou co-produzindo) seus álbuns e também divulgando e distribuindo. Só nos falta tal eficiência, mas com a concessão que estamos dando a elas não as culpando aqui, um dia chegarão lá. Esta “independência” está muito mais desenvolvida na música sim, é outro fato facilmente constatável, talvez pela estrutura mais simples, menor, tanto que possibilitou a internet a “disponibilizar” bem antes os arquivos de som (menores) que os filmes, mas aí já estaríamos entrando em outro assunto, a transformação enorme que a música, o cinema e quase tudo o que conhecemos está passando, que é o suporte (ou a ausência de) destas formas de arte, e da mídia em geral, que acabam nos propondo novos hábitos, interessantes, baratos e rápidos. Mas, cuidado, se engana quem pensa que o modelo tradicional de gravadoras e produtores de cultura em geral (cinema, CD, etc...) está fadado a desaparecer brevemente. Afirmar isto a esta altura seria bem pior que ingenuidade (no mau sentido), seria burrice.
O mais recente grande mau exemplo de um CD com data cravada na divulgação, mas não cumprida, foi o do CD do Iron Maiden “The Final Frontier” que, além de não ter sido lançado na data prevista, longe disto, ainda veio com o encarte defeituoso, ou seja, a gravadora EMI (e nem a fábrica, diga-se) não abriu o CD pra conferir. Falta total de controle de qualidade. Infelizmente pra lá de comum nos selos independentes. A EMI fez um recall eficiente, mas recall é recall.
Como vimos, mesmo tentando entender toda a logística, mesmo tendo o controle de todas as etapas da produção de um CD, passando inclusive pela divulgação e distribuição, ainda que abundando competência de toda parte, nem assim pode-se garantir com toda certeza que um CD estará numa loja tal data. E a culpa deve, DEVE, ser distribuída e maior ou menor quantidade entre a loja, a gravadora e a fábrica, e até aos próprios músicos, quando independente. Esta é a forma mais justa de se culpar alguém.
Pra não terminarmos com uma sensação de “ah, então nem adianta”, vamos a dois últimos exemplos, agora bem sucedidos. Ambos da (nem por isto melhor) gravadora Universal Music, que divulgou o lançamento do Metallica “Death Magnetic” e do Guns’n’Roses “Chinese Democracy” com data cravada, mas se acautelou, apelou para um truque, dizem, muito utilizado na era áurea do vinil nos USA, um truque tão simples como toda idéia genial é que, assim que tomamos ciência dizemos: “que óbvio”: conclui todas as etapas ANTES da divulgação, ou seja, com os CDs já fabricados no estoque inicia-se a divulgação, não tem erro do CD não ficar pronto a tempo e, com um prazo pra lá de elástico, inicia a pré-venda para as lojas. O CD chega à loja um ou dois dias antes da data, com o adesivo “Atenção Entregar Somente em XX/XX/XX”. Pronto. Claro que sempre tem os idiotas de sempre que estragam tudo, sempre tem a loja que vende o CD antes do prazo, mas percebamos que nem o cliente final enxerga esta loja com bons olhos pois, no fundo, ainda que inconscientemente, sabe que esta loja quebrou a regra do jogo, e isto nunca é legal.
Então, quando o CD não estiver na loja no dia que prometeram, antes de agredir o lojista, ou mudar de site, por favor, lembre-se de tudo isto. ;-)
Vincent Morrison
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