sexta-feira, 19 de março de 2010

Desolate Ways by Lucas Mosca (matéria para o zine O Grito)

Nosso amigo Lucas entrevistou a banda Desolate Ways com exclusividade para nosso zine impresso. Enquanto não publicamos lá, a matéria está NA ÍNTEGRA aqui. Valeu Lucas, muito obrigado pelo intetesse e pelo talento de sempre, e valeu também a disponibilidade e o coração aberto da banda Desolate Ways. Esperamos que curtam...


DESOLATE WAYS

“Conquista, caminhada e realização!”

por Lucas Mosca

Quem acompanha a carreira desses gaúchos de Torres sabe não é de hoje que o Desolate Ways é uma das melhores bandas nacionais do metal em geral. E no estilo praticado pela banda, um gothic/doom de muita classe, pode-se afirmar que o primeiro lugar do pódio brasileiro pertence a ela. Desde seu primeiro álbum, Eternal Dreams (2003), até o mais recente, Last Moons (2009), lançado pela Die Hard Records, percebemos a latente evolução dos integrantes do conjunto, tanto na parte musical como lírica das composições. Os responsáveis pelo deleito sonoro são: Max Lima (vocal e guitarra), Rodrigo Fernandes (baixo), Igo Menegaz (bateria) e Elizeu Hainzenreder (guitarra), que concedeu a entrevista a seguir:

O Grito: Qual a origem do nome da banda?
Elizeu Hainzenreder: A origem é uma referência ao clima de nossa terra natal, Torres, durante o inverno. Apesar de ser uma cidade litorânea, no inverno faz muito frio, os dias são nublados e a cidade é deserta. Quando éramos crianças, a única coisa que tínhamos para fazer com exceção do colégio era nos encontrarmos uns nas casas dos outros, com uma pilha de vinis embaixo do braço. Eu não saberia dar uma explicação científica sobre o clima da região. Mas acredito que, por estar localizada entre o mar e a serra, as coisas sejam bem malucas e estranhas por aqui.

O Grito: Qual foi a inspiração para o título, as letras e a arte gráfica do disco novo?
Elizeu: No Tearful, nós tentamos falar a respeito dos sentimentos envolvendo a morte de alguém muito próximo. Eu havia perdido minha mãe na época, e resolvi escrever um pouco a respeito. No Last Moons, a ideia é mais ou menos parecida, mas da perspectiva de quem está no final da vida, no final de sua caminhada. Por isso as letras falam bastante sobre arrependimentos, mágoas, a falta de sentido das coisas, a existência ou não de Deus e nossas atitudes perante tudo isso. A inspiração da arte se deu em cima de uma coletânea do The Cure (Staring At The Sea), um vinil que escutei muito quando era moleque. E o senhor que aparece na arte é pai do nosso baterista, Igo.

O Grito: Desde o Eternal Dreams, a carga emocional, densa, instrospectiva nas composições do grupo é bem intensa. Em Last Moons, a pegada não foi diferente. Pelo contrário: parece que tais sensações estão ainda mais intensificadas. A que se deve isso?
Elizeu: Acredito que seja a experiência e a evolução como músicos. Quando começamos, não posso dizer a você que éramos bons músicos. É muito difícil, e acredito que sejam poucas as pessoas que conseguem de fato colocar 100% de seus sentimentos ao tocar um instrumento. Acho que estamos aprendendo isso e nos aprimorando mais com o passar dos anos. É como me dizia o Earth [da banda brasileira Seduced by Suicide], durante a gravação do solo da faixa Last Moons, “faça sua guitarra chorar”.

O Grito: A voz feminina na faixa “Winter” consta no encarte de Last Moons como sendo de Josie. Conte-nos um pouco sobre ela.
Elizeu: Josie é vocalista da banda A Sorrowful Dream, da qual somos muito amigos há vários anos. Quando escrevi a faixa “Winter”, senti a necessidade de uma voz feminina. Então, pensar nela na hora foi mais que óbvio pra mim. Fizemos o convite e, para nossa sorte, ela topou. Gostei muito do resultado.

O Grito: Os dois primeiros trabalhos do conjunto, Eternal Dreams e Tearful tiveram a produção de Adriano Sperandir, do Arroba Studios. Já no disco novo, tal tarefa ficou a cargo de Earth, no Estúdio Nitro. Gostaria que você falasse sobre o que motivou essa troca e quais foram os resultados mais perceptíveis dessa mudança para o grupo?
Elizeu: Nós decidimos mudar pelo simples fato de que é necessário mudar. Os dois primeiros álbuns ficaram muito bons. Mas acredito que já estava na hora de uma produção diferente. Não estou querendo dizer que o Arroba Studios ou que Adriano Sperandir não sejam bons, muito pelo contrário. Mas não queríamos outro álbum com a mesma produção. Queríamos ir além. Estávamos quase fechando a produção desse novo disco com Simon Efemey [que já produziu gigantes como Paradise Lost, Obituary, Napalm Death, Amorphis, entre outros]. Iríamos gravar o álbum no Estúdio Nitro e enviá-lo para o Simon fazer sua parte. Mas o Earth, que conheço há anos, me convenceu a fazermos tudo no Nitro (risos). E posso dizer que todos estamos muito impressionados e realizados com o resultado.

O Grito: No site do grupo, vocês resumem uma parte história de vocês da seguinte forma: “Quatro amigos de infância resolveram montar uma banda que unisse o heavy metal com o rock gótico da década de 80”. Quais são propriamente as bandas e artistas que mais influenciaram (e influenciam) o Desolate Ways, levando em conta o conjunto geral da obra?
Elizeu: São muitas as bandas que nos influenciam. Mas as que nos diferenciam dentro do metal são conjuntos como The Cure, Sisters Of Mercy, The Mission, The Cult, Dead Can Dance e toda aquela safra de grupos góticoss da década de 80. Além, é claro, do velho Black Sabbath.

O Grito: Se você tivesse que definir em uma palavra cada álbum da banda, quais seriam elas?
Elizeu: Eternal Dreams: Conquista; Tearful: Caminhada; Last Moons: Realização.



O Grito: Como você rotularia o gênero musical praticado pelo Desolate Ways?
Elizeu: Olha, essa coisa de rótulo é algo que eu não dou a mínima. Confesso que, às vezes, me deixa até irritado. Mas, para localizar melhor as pessoas com relação ao nosso trabalho, eu chamaria de gothic metal. Pois o que fazemos é exatamente isso, juntamos dois mundos, o gótico e o metal.

O Grito: Você acha que o estilo de música executado pela banda é um pouco limitado em termos de abrangência de público no campo do metal? Por quê?
Elizeu: É um pouco limitado sim, mas aqui no Brasil. O brasileiro ainda é um pouco preconceituoso com o estilo. Ou talvez não seja preconceito, e sim preferência mesmo. Acho o público brasileiro muito parecido com o americano. Ou seja: são públicos com preferências por coisas mais pesadas e extremas. Basta você comparar as vendagens de CDs e ingressos de shows de bandas do nosso estilo com as de thrash, death e black metal. Mas, ao mesmo tempo, acredito que este cenário está mudando. Pois, a cada lançamento, mais pessoas se interessam por nosso trabalho.

O Grito: A partir do álbum Tearful, a visibilidade do grupo vem aumentando, com materiais ganhando destaque tanto aqui no Brasil como em países do exterior, como Noruega, Polônia, Romênia e demais países europeus. Como anda a receptividade dos fãs e da crítica em relação ao último álbum?
Elizeu: Realmente temos uma grande aceitação no continente europeu. Mas, com relação ao novo álbum, ainda não foi iniciada a divulgação do mesmo no exterior. E isso se deve ao fato de estarmos em negociação com algumas gravadoras de lá. Nosso contrato com a Die Hard é apenas para o Brasil. Então, em breve, teremos alguma ótima notícia para passar a todos os nossos fãs europeus. Já aqui no Brasil, a aceitação do público e da crítica está sendo fantástica. Acredito que mais e mais pessoas estão se interessando por nós.

O Grito: Elizeu, nestes mais de 12 anos de existência do Desolate Ways, quais foram os momentos mais marcantes para a banda na sua visão?
Elizeu: Acho que foi o lançamento do primeiro e do novo álbum e o reconhecimento das pessoas que gostam da gente. É estranho, pelo menos pra mim, olhar para minha coleção de CDs hoje e ver três álbuns de uma banda chamada Desolate Ways, da qual faço parte, misturados a discos do Black Sabbath (risos). Apesar de ser muito, muito difícil, manter uma banda como a nossa, em um país como o nosso, é exatamente isso que me faz orgulhoso de toda a nossa trajetória. E é claro, se não fossem os fãs, não estaríamos aqui hoje.

O Grito: Entre os que conhecem a banda, muitos a classificam como o “Paradise Lost brasileiro”. Você concorda que há uma considerável semelhança no estilo vocal, harmônico e artístico entre as bandas – como demonstra o trabalho do vocalista Max Lima, suas melodias e riffs de guitarra e as ilustrações do artista Anderson L.A?
Elizeu: Primeiramente, gostaria de dizer que considero um elogio ser classificado como “Paradise Lost brasileiro”. Pois esta é uma banda que eu curto muito, e eles são os criadores do estilo do qual nós fazemos parte. Então, justamente por isso, existem e vão existir semelhanças em melodias vocais, melodias de guitarra, visual, estética e temáticas de ilustrações. Listar Paradise Lost, Desolate Ways, Type O Negative e Sentenced é a mesma coisa que eu listar Helloween, Gamma Ray, Stratovarius e Edguy. São bandas de um mesmo estilo, com influências semelhantes. Lógico que cada uma delas tem suas particularidades, ninguém tenta copiar ninguém, mas, no fim, são semelhantes entre si, devido ao estilo ao qual pertencem e seguem.

O Grito: Ao livro The Spiritual Significance of Music: Metal Edition, do autor Justin St. Vincent, você deu uma declaração muito bonita a respeito da espiritualidade, que segue reproduzida aqui: “Eu acredito que o lado espiritual é um grande responsável por toda música escrita com o coração. Se existe um deus, então a música é certamente nossa forma de conversar com ele”. Qual sua orientação religiosa e como isso o influencia no seu dia a dia?
Elizeu: Eu sou ateu. E, como todo “bom” ateu, tenho que ver pra crer. E até hoje não tive nenhuma prova da existência de deus. É como eu disse no livro do Justin, “se existe um deus...” Lógico que eu gostaria muito que existisse um. Acho que todos gostariam disso. Explicaria muita coisa. Pois, mesmo com todas as nossas descobertas científicas, ainda estamos no escuro. Será que realmente é só o acaso ou existe algo mais? Eu acredito que é só o acaso, pois é o que eu tenho hoje em mãos. Não tenho comprovação de nada divino. E acho muito triste saber que existem pessoas que são “boas” apenas por acreditarem na existência de algo superior. Isto é deprimente pra mim. Sei que pode soar como utopia, mas creio que devemos ser bons pelo simples fato de ser. Não por medo de algum Deus, ou por interesse em alguma recompensa após a morte. Meu dia a dia é: “não faça aos outros o que não gostaria que fizessem a você.” É muito simples. Mas como acredito que ninguém tem a resposta certa, seria muita prepotência da minha parte afirmar qualquer posição como sendo definitiva. Pois, a afirmação que eu tenho hoje, amanhã pode ser derrubada.

O Grito: Vocês planejam realizar em breve alguma turnê no exterior? E quando os fãs paulistas terão novamente a chance de ver a banda tocando no estado?
Elizeu: Turnês no exterior dependem do lançamento de nossos trabalhos por lá. Não acho vantajoso uma banda se aventurar em uma turnê se as pessoas de lá ainda não possuem acesso aos seus álbuns. Principalmente em um cenário onde existem milhões de conjuntos em atividade. É um mercado muito difícil. As bandas deveriam se conscientizar que, sem trabalho lançado naquele continente, somos apenas mais uma banda tocando. Quanto ao estado de São Paulo, talvez a gente se encontre este ano ainda. A última vez que tocamos por aí foi em 2004, e foi muito legal. Vamos aguardar pra ver se acontece novamente.

O Grito: Quais seus cinco discos preferidos de todos os tempos?
Elizeu: Pergunta difícil essa, mas vamos lá: Heaven and Hell (Black Sabbath), Black Album (Metallica), Draconian Times (Paradise Lost), First And Last And Always (Sisters Of Mercy) e Within The Realms Of A Dying Sun (Dead Can Dance).

O Grito: Elizeu, muito obrigado pela entrevista. Por favor, deixe uma mensagem ao público leitor d´O Grito, o espaço é todo seu.
Elizeu: Gostaria de agradecer o espaço e todos os leitores d’O Grito. Espero encontrar todos vocês de São Paulo ainda este ano. Muito obrigado pelo apoio.

Um comentário:

Unknown disse...

Legal sua matéria, Lucas. Parabéns!